sábado, 10 de fevereiro de 2024

Sobre as ideias mirabolantes que eu não tenho mais

    Sábado de carnaval e uma cólica que não me deixa esquecer que solidão e solitude são as mesmas coisas, pelo menos nesse momento. Não há música, idioma, cheiro que me faça lembrar da última vez que eu quis ser alguém espetacular. Aquele um em um milhão, sabe. Aquele ser iluminado e energético que quer mais que o mínimo, que sonha com romances bregas de literatura e que espera ser escolhido por outro ser iluminado que quer ser espetacular e etecetera e tal.

    Observando minha lista de favoritos eu reparei o quanto eu amo as mesmas coisas já faz tempo, e acho que minha história com a música e a escrita já tinha deixado isso claro, porém é um pouco mais do que isso. Encontrei dicas de roteiro, um site para baixar todas as temporadas de I Love Lucy, uma receita de roteiro de sitcom, fora um outro site para baixar todas as temporadas de Cold Case, que eu já estou terminando, aliás, dentre dicas para aumentar o vocabulário em inglês e músicas que eu adoro mas que exigem uma habilidade que eu não tinha.

    Eu não me incomodo, sabe, em amar as mesmas coisas por tanto tempo, só que eu me incomodo com a ausência de ideias durante esses anos.

    Lembro que dois anos atrás eu havia começado a escrever um roteiro. Lembro da ideia, do conflito principal, do final do episódio. Lembro que eu estava pesquisando muito sobre o assunto, então eu tive muita dificuldade em absolutamente tudo por não ter tanta informação. Lembro que foi justamente por isso que comecei a assistir I Love Lucy, já que eu não me identifico muito com os seis amigos que fizeram um sucesso absurdo nos anos 2000 (independente de qual você pensou, é esse mesmo).

    Lembro da pessoa que aos 22 estudava alemão sozinha enquanto escrevia um livro de literatura adulto porque queria concorrer à uma bolsa de estudos para escritores na Alemanha. 

    Eu posso culpar a vida adulta, posso culpar um alfabeto inteiro de doenças psicossomáticas, posso falar que o capitalismo no Brasil não dá espaço para um óssio criativo (isso aqui é verdade, aliás). Posso falar que eu fui quebrada muito mais vezes do que eu gostaria e demorei muito mais tempo para me colar do que eu achei que levaria, fora esse processo de aceitação, de retirar a culpa de dentro de mim, de voltar a ficar de pé em situações que ninguém nem deveria ter que passar.

    Mas não faz diferença. Achar o culpado não me faz voltar a ler sobre processos criativos, padrões de roteiro nem voltar a estudar escalas e técnicas que eu nunca entendi. Achar o culpado não faz com que eu volte a acreditar que eu posso, sim, ser alguém espetacular. Aquele um em um milhão, aquele ser iluminado, aquele ser escolhido.

    Talvez seja esse o problema, sabe. 

    Existe uma lista de culpados.

    Mas e aí?


    *

Um comentário:

  1. Sua postagem é um farol de brilho! Esclarecedora, bem elaborada e totalmente envolvente. Obrigado por compartilhar sua perspectiva conosco.

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